sábado, 11 de novembro de 2017

Isabel I. O Anoitecer de um Reinado. Margaret George. «Esta substituição, este Medina-Sidonia, não sabe muito. Fica até enjoado no mar. Que almirante!»

Cortesia de wikipedia

Isabel. Maio de 1588
«(…) Peço que se sentem, disse a eles. Permaneci em pé. Atrás de mim estava o enorme mural de Holbein que cobria uma parede inteira com os retratos do meu pai e do meu avô. Nele, meu pai, coroado em primeiro plano, fazia o seu próprio pai parecer encolhido atrás de sua sombra. E agora eu estava na frente dele. Herdei a sua força ou estava apenas dizendo a ele que o domínio da monarquia pertencia a mim agora? Em vez de obedecer, Robert Dudley deu um passo à frente e me entregou um lírio, desabrochando no seu longo caule. Um lírio imaculado para uma flor-de-lis imaculada, disse, fazendo uma reverência. Tanto Burghley quanto Walsingham olharam de forma resignada, balançando a cabeça de forma negativa. Obrigada, Robert, disse. E, em vez de pedir um vaso, deixei a flor em cima da mesa, atrás de mim. Um local que a faria murchar rapidamente. Agora, sente-se. Burghley disse: creio que todos já viram o documento chamado Declaração de Sentença e Deposição de Elizabeth. Se não viram, tenho aqui algumas cópias. Cerrei os dentes só de pensar! Deus do céu! Os espanhóis me perseguirão até no inferno? Vossa Majestade, isso não é novidade, lamentou Walsingham. Houve pouca mudança depois das duas primeiras bulas, a de 1570, escrita pelo papa Pio V, e a seguinte, em 1580, escrita por Gregório XIII. A cada novo papa, uma nova bula. Um navio cheio delas é que é a novidade, disse Burghley. Desprezível! Para eles é uma cruzada religiosa, afirmou Walsingham. Todos os navios têm nome de santo ou ano. O estandarte da bandeira, que traz a Virgem e a Crucificação, foi abençoado pelo arcebispo de Lisboa. Porque não as bulas nos porões? Ah, a senhora vai adorar saber disso. Tenho a lista das senhas deles. Aos domingos é Jesus, às segundas-feiras é Espírito Santo, às terças-feiras é Santíssima Trindade, às quartas-feiras é são Tiago, às quintas-feiras é anjos, às sextas-feiras é Todos-os-Santos e aos sábados é Nossa Senhora. Leicester suspirou e deu uma risada.
Com nomes como Drake e Hawkins, não gostaria de saber quais seriam as nossas senhas, disse ele. Ah, e todos os homens a bordo se confessaram e trazem consigo um certificado de comprovação, completou Walsingham. Ele continuava a surpreender-me. Onde conseguia todas aquelas informações? Deve ter subornado um padre para obter tantos detalhes, disse. O silêncio dele provava que eu estava certa. Por fim, completou: e há pessoas aqui na Inglaterra, sim, mesmo em Londres, que estão rezando pelo sucesso da missão. Se diz isso, deve saber os nomes delas. Diga-me, para qualquer outra pessoa teria sido difícil, mas eu sabia que ele tinha acesso às informações, simplesmente queria estar a par dos factos também. Philip Howard, conde de Arundel, respondeu ele. Até mesmo na Torre ele conseguiu reunir adeptos e chamar um padre para rezar uma missa para a Armada e para os ingleses que estão a bordo. E, sim, posso fornecer nomes de todos os que estavam presentes. Ingleses a bordo!, disse o conde de Leicester. Que vergonha! Walsingham deu de ombros. Lúcifer e os seus legionários recrutam por toda a parte. Arundel é afilhado de Filipe. O que esperava? Quando a Armada partiu?, perguntou Burghley. Ela já partiu? Ainda está em Lisboa. Os meus informantes disseram que há cerca de cento e cinquenta navios. Nem todos, claro, são navios de guerra. Muitos são mercadores ou navios de abastecimento. Será a maior frota que já saiu para o mar, disse o conde. Se conseguirem sair, pois perderam o seu comandante há dois meses, disse sarcasticamente fazendo o sinal da cruz. Mande-os de volta. Santa Cruz sabia o que estava fazendo. Esta substituição, este Medina-Sidonia, não sabe muito. Fica até enjoado no mar. Que almirante! Conquistar Portugal há oito anos, com os navios e o porto em Lisboa, foi o melhor golpe de sorte que lhes poderia acontecer, e o pior para nós, disse Burghley». In Margaret George, Isabel I, O Anoitecer de um Reinado, tradução de Lara Freitas, Geração Editorial, 2012, ISBN 978-858-130-076-4.

Cortesia de GeraçãoE/JDACT